de repente sobressalta-me a vontade de escrever algo
positivo. é tanta queixa de todos os lados que temo pela existência do universo.
hoje é véspera de lua cheia. dá pra acreditar que há uma lua girando sobre o
mundo? certa vez, no Pantanal, eu dirigia sozinho por estradas de terra, por
campos e por areais, quando me perdi. tentei, a todo custo, encontrar o caminho
de volta para a fazenda que me hospedava, mas apenas me perdia mais e mais.
então encontrei um lago escondidinho, envolto pela mata densa, tomado por todas
as aves possíveis e imagináveis, de todas as cores e de diversos tamanhos. observei
aquele berço de absoluta beleza por alguns segundos e parti, com receio de que
minha simples presença pudesse violá-lo. há uma senhora abandonada num asilo
qualquer e para ela o milagre do universo se resumiria em ter companhia na hora
da novela. no calçadão de Copacabana, a garota de programa encerra o expediente
e joga conversa fora com o garçom do quiosque. ele lhe serve uma água de coco por
conta da casa, ela sorri e retoma a fé na humanidade. trago um poema de Carlos
Drummond de Andrade desde sempre no meu peito, como se fosse do próprio ar que
respiro. confesso que nunca lhe desvendei o significado. a beleza tem
dessas coisas; ao contrário das tragédias que nos atropelam com a insignificante
transitoriedade de tudo que julgamos importante, a verdadeira beleza não traz
qualquer impacto prático no cotidiano. é apenas um moleque descalço de sorriso
branco. certa vez, também no Pantanal, eu encontrei a onça-pintada na beira do
rio. a moça humilde está feliz, pois foi bem tratada no posto de saúde. duas
meninas dividem um bombom e batem par ou impar para ver quem fica com a parte
maior. e amanhã é noite de lua cheia.
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