de repente sobressalta-me a vontade de escrever algo
positivo. é tanta queixa de todos os lados que temo pela existência do universo.
hoje é véspera de lua cheia. dá pra acreditar que há uma lua girando sobre o
mundo? certa vez, no Pantanal, eu dirigia sozinho por estradas de terra, por
campos e por areais, quando me perdi. tentei, a todo custo, encontrar o caminho
de volta para a fazenda que me hospedava, mas apenas me perdia mais e mais.
então encontrei um lago escondidinho, envolto pela mata densa, tomado por todas
as aves possíveis e imagináveis, de todas as cores e de diversos tamanhos. observei
aquele berço de absoluta beleza por alguns segundos e parti, com receio de que
minha simples presença pudesse violá-lo. há uma senhora abandonada num asilo
qualquer e para ela o milagre do universo se resumiria em ter companhia na hora
da novela. no calçadão de Copacabana, a garota de programa encerra o expediente
e joga conversa fora com o garçom do quiosque. ele lhe serve uma água de coco por
conta da casa, ela sorri e retoma a fé na humanidade. trago um poema de Carlos
Drummond de Andrade desde sempre no meu peito, como se fosse do próprio ar que
respiro. confesso que nunca lhe desvendei o significado. a beleza tem
dessas coisas; ao contrário das tragédias que nos atropelam com a insignificante
transitoriedade de tudo que julgamos importante, a verdadeira beleza não traz
qualquer impacto prático no cotidiano. é apenas um moleque descalço de sorriso
branco. certa vez, também no Pantanal, eu encontrei a onça-pintada na beira do
rio. a moça humilde está feliz, pois foi bem tratada no posto de saúde. duas
meninas dividem um bombom e batem par ou impar para ver quem fica com a parte
maior. e amanhã é noite de lua cheia.
Tuesday, November 24, 2015
Wednesday, November 11, 2015
no bar da esquina, pede-se outra rodada de chope
20hs. do outro lado da rua, um hotel. na altura dos meus
olhos, oitavo andar, um quarto se acende, e adentra um homem de terno azul
escuro. ele deita o paletó com zelo sobre a primeira das duas camas gigantes.
perde-se por alguns segundos num detalhe qualquer do quarto, caminha à janela. cerra
os olhos, respira, afrouxa a gravata. está exausto. retorna de um longo dia de
reuniões que, de repente, perdem sentido. os olhos buscam a rua e encontram a
vida do bar da esquina. o pensamento ameaça voltar a assuntos de trabalho, o
homem se recusa, desabotoa a camisa e massageia a própria nuca. ele fecha a
persiana, mas eu sei o que ele faz longe de meu olhar. ele retorna para o meio
do quarto, liga a televisão, senta-se sobre a cama próxima à janela, tira os
sapatos, escorrega o corpo até a cabeceira, ajeita uma almofada, encosta-se na
parede, agarra o controle remoto e pula de canal em canal até se perder no
absoluto nada.
eu sinto inveja daquele homem. queria estar nesse vazio que
segue a exaustão, cansado ao ponto de que nada mais tem relevância. meu cansaço
não sabe me esgotar por completo. no bar da esquina, pede-se outra rodada de
chope.
Wednesday, November 04, 2015
imensa pátria dos desenganados
eu gostaria de criar alguns países novos.
num deles, colocaria o Lula como presidente e Genuínios,
Dirceus e Delúbios como ministros. nesse país, poderiam morar todos aqueles que
ainda confiam nos caciques do PT e acham que tudo é mentira da oposição. seria
uma país do estado total, com nenhuma empresa privada. haveria bolsas de tudo
para todos, intercâmbios culturais com Cuba e um bloco econômico formado com os
vizinhos Venezuela e Bolívia. o dinheiro sem fim viria não se sabe donde. investigar
políticos por corrupção seria proibido.
no outro país, Cunha seria presidente e a bancada BBB (bala,
boi, bíblia) lhe auxiliaria. seria um país para todos aqueles que são contra a
liberdade excessiva das mulheres e os direitos civis dos homossexuais. nas
escolas, o ensinamento seguiria o conhecimento da bíblia. o porte de armas
seria liberado, e qualquer desavença se resolveria pessoalmente. não haveria
florestas, toda terra seria destinada à agropecuária, e os transgênicos
reinariam absolutos. políticos teriam direito a gratificações sobre a
rentabilidade de estatais, depositadas em contas na Suíça.
no terceiro país, Jean Wyllys seria o presidente e Gregório
Duvivier o pai da constituição. seria o país da liberdade dos oprimidos. policiais ficariam
presos e os ladrões policiariam as ruas, para compensar o fato de que são
vítimas duma sociedade hierárquica desigual com pressupostos humanitários
invertidos pela ganância do capital inescrupuloso. a maioridade penal passaria
dos 18 para os 81 anos. a profissão de babá seria extinta por decreto.
no quarto país, voltaríamos à ditadura. seria a pátria alegre
daqueles que tanto pedem o retorno dos militares. pronto, uma ditadura só para chamar
de sua. bandido bom seria bandido morto, e, talvez, o desenho do Bob Esponja fosse
banido da televisão, pois o personagem do Lula Molusco poderia ser um risco à
soberania nacional. nas escolas, nada de alunos desobedientes, solitária neles.
baderna, nunca mais. o termo maioridade penal inexistira. um recém-nascido poderia
ser responsabilizado por seus atos.
é claro, não me esqueci, haveria ainda o país governado por
Aécio. seria o paraíso das empresas privadas, tudo padrão Fifa, a prova viva de
que empresas privadas são de transparência exemplar. bicicletas seriam banidas
das ruas, e os carros recuperariam os espaços que as ciclovias usurparam. um
pool de cervejarias administraria escolas, universidades e empresas
de jornalismo. ao contrário do país governado por Lula, investigar políticos
seria sim permitido, desde que da oposição, é claro.
por fim, haveria um último país para todos aqueles que não
se enquadrassem nos outros. seria o país das sobras. um país em que ninguém
acreditasse que esse ou aquele discurso radical faz a mínima diferença. um país
em que as pessoas se dessem conta de que a educação, a honestidade e o respeito
ao próximo são os únicos pilares necessários a uma grande nação. acredito que esse
último país já exista há muito tempo: é a nossa imensa pátria dos desenganados.
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